domingo, 12 de março de 2017



         MORTOS VIVOS

Estarmos vivos até pode ser sorte
com tanta violência em ascensão
carregamos injustiças e medos
e não aguentamos o peso do ódio
que vai corroendo a humanidade;
amolecemos com falta de amor
trabalhamos duramente, calados
a viver sem fortuna e maus salários,
se não defendermos a dignidade
seremos como os pobres otários.

Militante das justas convenções
andei pelo mundo em movimento
professando a insigne humildade
do saber escutar e dar conselho
com a serenidade dum ancião
que sabe aos fracos dar a mão;
para os amigos mais gulosos
sussurro levemente aos ouvidos
para terem mais temperança
nos vinhos, petiscos e enchidos
para viverem melhores anos
e gozarem o sabor da bonança.

É um privilégio estarmos vivos
mesmo que nos julguem mortos,  
os bravos heróis nunca morrem
partem mas deixam suas obras…
percorremos caminhos com idade
apegados aos amigos presentes,
fazeremos preces pelos ausentes
até que se derrubem as fronteiras
e acabem os caminhos paralelos
para que se cumpra a santa união
numa salutar confraternização.  


                Joaquim Coelho





Razão da ida à Guerra

Por natureza, nenhum ser humano deseja a guerra. Os antepassados transmitiam o espírito de luta aos mais novos, por razões de sobrevivência, na disputa dos territórios e dos bens necessários ao consumo humano. Naturalmente que as pessoas tendem a defender aquilo que lhes pertence, mas ninguém tem vocação para o sofrimento que as guerras impõem aos seus participantes directos. Admite-se que muitos soldados têm relutância em combater, especialmente quando desconhecem a causa do combate. Mesmo o discurso do patriotismo não funciona para todos os cidadãos de igual modo, tendo em conta as mudanças sociais, a idade, o estatuto social ou a identidade com a Pátria.
No caso português, quase todos os combatentes foram empurrados para a guerra em circunstâncias adversas aos seus interesses, com fundamento na preservação do território português, tão propagado pela comunicação social e nos discursos oficiais. As características do povo português têm pouco de guerreiros mas muito de inocência ou moralismo ancestral, porque sempre fomos um povo mal compreendido pelos governantes com o complexo de superioridade justificado no compromisso mais absurdo da condição humana. A pregação dos superiores hierárquicos nunca foi capaz de justificar as razões da guerra nas terras ultramarinas, gratificante para alguns que colheram bons proventos, mas desgastante e dolorosa para a generalidade dos combatentes. Por razões de conveniência partidária, política e interesses militares, o abandono das terras ultramarinas criou graves prejuízos a muitos milhares de cidadãos que lá viviam, sendo a culpa da descolonização atirada para cima dos combatentes desmobilizados e abandonados à sua sorte. Por isso, aqueles que conseguiram integrar-se na sociedade, trabalhar e participar no desenvolvimento do país, tiveram o mérito de galgar as dificuldades e viver; já o mesmo não aconteceu com os que nunca conseguiram limpar da sua mente os traumas dos momentos difíceis, os quais continuam a carregar dentro de si as imagens terríveis dos mortos e esfacelados caídos a seu lado. Todos merecem respeito e reconhecimento, mas estes merecem, também, solidariedade pública.
Admitindo que muitos dos combatentes entenderam a sua missão fundamentada no sentimento de solidariedade para com os portugueses daqueles territórios, raramente o fizeram com o espírito de luta pela pátria, com consciência heróica. Freud soube definir as premissas que podem levar “os heróis ao espírito de luta” como justificativo da defesa duma comunidade que conduza ao conflito com significado moralista ou de defesa; daí se possa concluir que ninguém vai à guerra para ser herói, porque o sacrifício da própria vida não o justifica, especialmente quando os governantes desprezam a elite de homens que revelaram um estado de espírito altruísta e abnegado em circunstâncias severamente adversas na defesa das causas da Pátria. Embora não fossem bem compreendidos na sua missão, não desertaram… e cumpriram o sagrado dever que a Pátria lhes impôs, transmitindo à sociedade os valores duma elite moral e cívica que é cada vez mais rara entre a juventude.
É por tais razões que os combatentes são merecedores do respeito e do reconhecimento da Nação, especialmente dos organismos oficiais que devem proporcionar condições de vida tranquila, criando centros de apoio social, psíquico e psicológico para reparar as feridas invisíveis mas que podem ser detectadas em muitos dos intervenientes na guerra. O reconhecimento passa também pelos apoios sócio-económicos para os que não conseguiram integrar-se na vida profissional activa devido às mazelas resultantes da permanência em ambiente de guerra, que, objectivamente, causou estragos irreversíveis no miocárdio e no cérebro, levando ao desgaste prematuro destes órgãos, bem como à perda de proventos adequados à sua vida normal.
Finalmente, para os que assumiram o compromisso da defesa das causas da pátria, o reconhecimento dos esforços dos combatentes pode ser gratificante, em vez da repulsa e do negativo sentimento de abandono, prejudicial ao espírito de unidade nacional que se pode reflectir na sociedade civil e nas novas gerações.
Joaquim Coelho - Presidente da Associação MAC – Antigos Combatentes

e Coordenador do “Grupo de Trabalho” das Associações




O SÍNDROMA DOS EMBARQUES

A curiosidade deixa o pessoal preso à amurada e as madrinhas ficam chorosas e até as pedras do cais choram baixinho enquanto os familiares dos embarcados se acotovelam m na esperança de assinalar o último e doloroso adeus!

O destino é assim mesmo, incerto, pior do que a provação do adeus será ingrata sorte dos que embarcaram sem saberem para o que vão. Mas nem tudo é tão mau, embora a guerra seja um quadro pintado pela desgraça dos que morrem sem gentilezas da mata que os rodeia.
Muitos amores ficam assim abandonados no cais de embarque, mas serão avivados pelas cartas dos aerogramas, salvo se a fatalidade se intrometer pelo meio. Há que ter esperança, afugentando os sobressaltos dos dias mais custosos. As contingências das missões podem safar os embarcados onde tudo é possível.
A contar com o regresso, muitos destes soldados acreditam no amor que perdurará até ao reencontro da moça dos seus encantos. Só por ironia do destino o seu fado será atraiçoado. As despedidas são sempre dolorosas, mas os que partem para a guerra, ainda no tombadilho e encostados na amurada, não pensam nos imprevistos.

Não temos lágrimas sublimes, mas alguns abraços e beijos sem excentricidade e com algum erotismo. De resto, muita daquela gente amontoada no cais vive entronizada nas aldeias, coberta por um manto de virtude e vergada ao trabalho honesto.
Os primeiros arrepios com o embate das ondas alterosas aparecem à passagem frente ao estreito de Gibraltar. O convés fica cheio de escumalha viscosa, por causa dos mais indispostos vomitarem. Para muitos, a comida começa a ser um problema, porque quanto mais comem mais vomitam... e o navio começa a ficar mal cheiroso, um purgatório para alguns e um inferno para outros.
Uma saída em Lourenço Marques levou muitos a lambuzarem as prostitutas dos bares da rua Araújo. Por ali passam quase todos os mancebos que seguirão rumo a norte (Porto Amélia e Mocímboa da Praia). O fumo e o ruído misturam-se nos bares e nos bordéis, onde alguns se afogam em cerveja e os mais descuidados apanham as costumadas doenças venéreas ou esquentamentos! Quase sempre… alguém fica em terra, quando o navio se faz ao mar! É assim o bom povo português, quando vai em viagem para o outro lado da África. As contingências desastrosas começam logo aí, quando os comandantes não dão tolerâncias. Na imensidão das distâncias, ir à boleia é impensável! Mal puseram os pés em África e começam a sentir a penitência que lhes magoa a alma que não encontra salvação divina! Ainda não chegaram à guerra e já estão metidos em sarilhos, fruto da sua imprevidência e pouca vivência em terras estranhas. Em poucas semanas, os amores do cais de embarque começam a ficar esquecidos, tal é a tormenta das mudanças e o deslumbramento das confusões.
Instalados nos acampamentos distribuídos por Cabo Delgado, há soldados com diversos níveis de formação e padrões de educação, onde a convicção é coisa rara e o idealismo uma abstracção. O mundo dos sonhadores começa a desmoronar-se ao som do rebentamento das primeiras morteiradas. Muitos sonhos começam a ficar sem sentido, perante a dureza das caminhadas, o calor do planalto e a secura das savanas. A realidade começa a desgastar as energias próprias da idade, as emoções vão esmorecendo e a rigidez da disciplina e da ordem vão diluindo a educação genética dos ancestrais. As angústias e o medo acabam por sufocar a última esperança de resistir ao amotinar dos desejos e a vontade fica amorfa. A rigidez das regras de conduta em zonas de perigo vão-se desvanecendo e a exposição ao fogo inimigo deixa a morte descansada, porque não precisa de muito engenho para ter sucesso com a gadanha. Na guerra não há génios... mas pode haver sorte como também há imprevidentes ou incautos. Acontece que os mortos nem sempre são os menos cuidadosos... porque o azar bate à porta de qualquer um, quando as balas são invisíveis e fatais.


Joaquim Coelho – combatente em Angola e Moçambique



sexta-feira, 10 de março de 2017

   COMBATENTES,  
                 Porque é preciso avançar para a ÚLTIMA MISSÃO:

Prezados Amigos e Combatentes,

Combatentes abandonados e desprezados… Porquê?
a) - Porque cumpriram o dever patriótico de defender as terras de administração portuguesa onde nasceram e labutaram mais de meio milhão de cidadãos portugueses?
b) - Porque foram os mancebos sacrificados nas guerras ultramarinas, onde se debatiam os tenebrosos interesses internacionais?

1 - Porque não houve apoios aos Antigos Combatentes, após a desmobilização?
a) – No decorrer das guerras ultramarinas, os mancebos entravam nos quartéis sem perceberem a tormenta que os esperava. A preparação militar nem sempre foi bem encarada e as dificuldades de adaptação eram descoradas pelo regime, porque interessava avançar “rapidamente e em força”. Assim se passaram 13 longos anos de incertezas, sem que fossem valorizados os Antigos Combatentes, mesmo depois da desmobilização.  
b) – Veio a revolução de Abril, conduzida por militares, sem preparação política nem conhecimentos de administração pública, que procuraram controlar os departamentos do Estado; nem sempre respeitaram as normas de conduta, leis fundamentais e os valores patrióticos; perante a conjuntura internacional, cederam a uma descolonização apressada e atribulada que não acautelou a segurança dos Combatentes em campanha nem os interesses e os bens dos portugueses residentes nas ex-províncias ultramarinas;
c) - Em consequência, a desmobilização e desactivação dos postos e aquartelamentos no interior das ex-províncias ultramarinas e a desorganização da logística de campanha deixou muitos militares sem condições mínimas de sobrevivência, sem alimentos e em perigo;
d) – Na desmobilização, faltou o acompanhamento e apoio na integração plena e com dignidade, dos Combatentes, na sociedade onde, muitos milhares deles, regressados à metrópole, tiveram que sobreviver com a sua sabedoria e na lei "do desenrasca";
e) – A preocupação maior dos “militares de abril” foi consolidar a democracia e a liberdade, o maior feito da revolução; mas, talvez tenham exagerado na construção das bases de sustentabilidade das suas benesses; depois, negligenciaram a integração na sociedade dos militares desmobilizados, especialmente os que regressaram com problemas derivados do stress de guerra e necessitavam de apoios especiais. Honra lhes seja feita por terem apoiado e participado na criação da Associação dos Deficientes das Forças Armadas, que acolheu os estropiados pela guerra, dando-lhes as condições de dignidade merecidas;
f) - Garantido o futuro para os militares, o Conselho da Revolução cedeu os poderes aos governantes civis, muitos deles exilados e desarticulados da Pátria, que se apoderam das instituições e dinheiros do Estado, em desfavor dos restantes cidadãos que, entretidos com as promessas leiloadas a desbarato, foram trabalhando ao sabor da corrente, sem perceberem os enganos de todos os anos, deixando no total esquecimento e desprezo os Antigos Combatentes, mesmo os traumatizados e com dificuldades de integração social.

2 - Porque falharam as Associações de Combatentes?
a) - Como sempre, os governantes procuram controlar o ímpeto reivindicativo dos que se tentam organizar para fazer valer os seus direitos. Quando alguns Antigos Combatentes deram os primeiros passos para criarem associações, diversos oficiais, parte deles amigos e mandatados pelo Conselho da Revolução, infiltraram-se no "movimento" para manipular e desmotivar as manifestações reivindicativas... e, perante a "inocente confiança, o espírito de camaradagem criado no ambiente de dificuldades da guerra", conseguiram os seus nefastos intentos e prejudicaram todos os Antigos Combatentes, que ficaram na sombra do desprezo e do esquecimento, sem reconhecimento e reparação dos seus traumas;
b) - Depois, as inscrições de associados em grande quantidade, contribuíram com centenas de milhar de contos para os oportunistas e aldrabões gastarem em proveito próprio, não dando os devidos apoios e assistência, acompanhamento psicológico, psíquico e social aos Antigos Combatentes que careciam deles; esses desmandos criminosos levaram à desmotivação associativa e à descrença na resolução dos reais problemas e reconhecimento da sua prestação em defesa dos valores patrióticos.
c) - Para completar o quadro que agrada aos oportunistas e cria dificuldades acrescidas aos Antigos Combatentes que necessitam de apoio social e na doença, os governantes agiotas, através do Ministério da Defesa, dão milhares de Euros, anualmente, a meia dúzia de "associações" que o justificam no "apoio" a escassas dezenas de Combatentes, enquanto outros carenciados (mais de 100 mil) vivem ou sobrevivem com muitas dificuldades. Perante tal quadro, os governantes limitam-se a subsidiar as Associações reféns destas migalhas, as quais perderam o poder reivindicativo para resolução dos graves problemas de saúde e sociais que afectam mais de 110 mil Antigos Combatentes. É por isso que o “Estatuto do Combatente”, importante instrumento legal e objectivo destinado a dignificar todos os Combatentes, continua a ser protelado e os possíveis beneficiários vão morrendo sem usufruírem dos contributos e direitos que justamente merecem.  

3 - Porque é URGENTE avançar por outros caminhos?
a) - 40 anos passaram sem que fossem reconhecidos os devidos direitos aos Antigos Combatentes. Com o desgaste do tempo e as vidas fragilizadas, somos uma geração em extinção prematura! Esta é uma realidade a que não podemos fugir, mas poderíamos resistir mais se devidamente acompanhados nas nossas debilidades.
b) - Os Almoços/Convívio são uma forma de "terapia" que ameniza os efeitos das angústias do tempo das guerras ultramarinas, o que é muito bom. Mas há muitos milhares de Antigos Combatentes a passar mal, com carências de alimento e tratamento na doença. Parte deles sem-abrigo, abandonados à sua má sorte. Esquecê-los seria ultrajar a nossa condição de homens de acção, com personalidades forjadas entre os trilhos e as matas africanas, muitas vezes, enfrentando graves perigos e dificuldades.
c) - Ainda somos um universo com cerca de 670 mil Combatentes vivos. Se despirmos as camisolas clubísticas e partidárias, unindo o que resta da nossa vida, com bom senso, pondo a inteligência e a vontade ao serviço dum OBJECTIVO comum, temos condições para cumprir a ÚLTIMA MISSÃO com convicção, sucesso e proveito, obrigando ao reconhecimento da nossa condição de cidadãos com dignidade e com direitos.
d) - Temos uma grande dispersão de "grupos" no Facebook. Por um lado pode ser positivo, por outro dificulta a nossa caminhada para o mesmo objectivo. Também não podemos ignorar uma realidade: as estatísticas indicam que apenas 10 a 15% dos Antigos Combatentes andam pela Internet! Logo, para a grande maioria, teremos que passar a informação por outros meios, pelo que apelamos à participação de TODOS neste projecto.

4 - Porque foi criado o Movimento Cívico de Antigos Combatentes 2006?
a) – Após algumas viagens realizadas aos territórios africanos onde andámos em guerra, cerca de 70 Antigos Combatentes vieram de Moçambique com vontade de resgatar para Portugal, terras de origem, os restos mortais dos nossos camaradas de armas que ficaram enterrados em vergonhosas condições de abandono e desleixo.
b) - Um numeroso grupo de voluntariosos Combatentes aderiu ao Movimento que, depois de contactos com Associações de Combatentes estrangeiras, por sugestão da Associação dos Veteranos Americanos, em 10 de Junho de 2008, montaram um "cemitério" simulado nos terrenos confinantes com o Monumento aos Combatentes, em Belém-Lisboa, tendo a dimensão de 2.000m2 quadros e 100 cruzes e campas simuladas, com os nomes de 20 dos nossos mortos ainda em África. Isso teve bastante impacto e levou a uma "campanha" de recolha de 17.450 assinaturas para a Petição entregue e aprovada na Assembleia da República em Junho de 2009. A Petição dava um prazo até final do ano de 2012 para que o Estado e Liga dos Combatentes resgatassem para as terras de origem os restos mortais de cerca de 1.780 Combatentes ainda em territórios africanos.
c) - Passou o prazo e muito pouco foi feito, embora continuem a gastar dinheiro com deslocações de membros da Liga dos Combatentes aos antigos territórios ultramarinos, em prol do programa "a conservação das memórias".
d) - Independentemente da organização de base do Movimento, após diversas reuniões de centenas de Antigos Combatentes atentos à situação dos mais necessitados, foi legalizada a Associação MAC e, na Assembleia-geral de 22 de Junho de 2013, nas Caldas da Rainha, foram eleitos os membros para os respectivos Órgãos sociais, com a finalidade de dar seguimento aos diversos projectos e sugestões avançadas por Antigos Combatentes, com espírito patriótico, voluntarioso e solidário.
e) - Aproveitando os estudos, sondagens e peritagens então conseguidas, a "Associação MAC", organizou dossiers documentados e, em Janeiro de 2014, reuniu com todos os Grupos Parlamentares da AR, com vista à criação do "Grupo de Trabalho" para legislar e publicar Leis e normas devidamente claras e exequíveis no “ESTATUTO do COMBATENTE”. Depois, reuniu com a Direcção da Liga dos Combatentes, onde ficou definida uma forma de conduta mais aproximada para atingir os objectivos comuns.
f) - Entretanto, um grupo de Cidadãos ligados às Ordens dos Economistas, Advogados, Técnicos Oficiais de Contas e outros, colaboraram, sob direcção da Associação MAC, na elaboração do “Projecto” de Estatuto dos Combatentes, bem como um "estudo financeiro" com sugestões de recolha de fundos para garantir a cobertura dos custos da aplicação prática e completa dos benefícios e apoios sociais a conceder aos Antigos Combatentes integrados no "Estatuto do Combatente", sem necessidade de recorrer ao Orçamento do Estado - trata-se de um "Fundo Autónomo" que será extensivo a todos os membros das Forças Armadas e Forças de Segurança, conforme legislação específica que contemple todas as perdas de ganho devidas a acidentes, em serviço ou fora dele, em missões internas ou externas, garantindo um futuro digno para os atingidos por deficiências ou doenças e familiares. Será entregue na Assembleia da República para apreciação e aprovação.

5 - Porque temos de avançar para uma Plataforma de intervenção política?
a) - Não há resposta às propostas e sugestões levadas aos Grupos Parlamentares, o que prova o desinteresse político na legislação que ponha em prática a solução justa e merecida pelos Antigos Combatentes – a elaboração e publicação do “Estatuto do Combatente”. O Ministério da Defesa continua a apoiar, financeiramente, algumas associações, como forma de dividir para reinar. Essa forma de governação está esgotada, porque serve poucos Antigos Combatentes, que não acreditam no sistema e estão fartos de ser enganados.
b) - Os governantes e a Liga dos Combatentes têm dado sobejas provas de que pouco farão em benefício dos Antigos Combatentes. Até a Lei 9/2002, que especifica alguns benefícios, acabou por ser adulterada e posta no caixote do esquecimento, porque há outras clientelas.
c) - As equipas de apoio aos sem-abrigo e desamparados pela sorte detectaram mais de 2.000 ex-Combatentes abandonados nas ruas da amargura. Os resultados do rastreio efectuado nos anos 2006 a 2009 confirmam a existência de cerca de 110 mil traumatizados pelo stress de guerra em todo o país, e poucos deles recebem apoios específicos para a doença. É vergonhoso que Portugal não honre os seus heróis e despreze os que, em determinado período da sua história, defenderam a bandeira nacional. É urgente resolver a vida destas pessoas carenciadas e dignificar uma geração de homens valentes.
d) - Independentemente dos interesses restritos das Associações, os membros aderentes e colaboradores do Movimento Cívico de Antigos Combatentes 2006 jamais aceitarão a subsídio-dependência e vão avançar com alternativas determinantes para atingir os objectivos; as quais passarão por negociações, comunicação social e manifestações de rua.
e) - Por tudo isto e porque acreditamos nas capacidades de observação e na lucidez dos Combatentes e dos membros das forças armadas e de segurança, apelamos a TODOS, aos familiares e Amigos para, em consciência e valorizando o espírito de união e camaradagem construído em tempo de guerra ou de paz, reverem a sua posição e tendência política, colocando acima dos seus interesses pessoais e partidários o interesse colectivo dos ainda vivos e, provavelmente, almejando um futuro melhor para os filhos e netos.

Estejamos atentos e vigilantes, para decidir bem o futuro. 


Reformulado a 22-05-2016 - Movimento Cívico de Antigos Combatentes 2006 – MAC 


quinta-feira, 9 de março de 2017

COMBATENTES - RAZÕES DOS CONVÍVIOS
Os danos da guerra são dolorosos e deixam feridas difíceis de curar. Além da destruição dos bens, perdem-se amizades e as relações entre seres humanos não valorizam a vida e a sua essência. É contra todas essas perdas que procuro reagir dando valor à riqueza que nos resta - fortes laços de amizade e camaradagem porque, entre os intervenientes nas guerras, esses valores foram a trave mestra a segurar a frágil condição humana de muitos combatentes, nos primeiros tempos de missão. Alguns perderam a bússola das suas vidas, numa agitação anormal da consciência e das emoções; não fora a mística do companheirismo, a desgraça dos traumatizados teria atingido uma dimensão muito mais grave e penosa para a sociedade portuguesa.
       Os jovens que um dia partiram do seio das suas famílias e foram desembarcados nos confins das terras de África, sobreviveram às angústias e aos perigos da guerra, também saberão responder adequadamente aos governantes que os desprezam como gente do mais reles da sociedade. Saberão honrar as memórias de todos os que morreram ao serviço da Pátria, porque são os guardiães dos nobres valores da Nação civilizada e porque juraram defender a bandeira de Portugal contra os traidores que a amarrotam e envergonham; a força da ética e da moral militares são válidas em todos os escalões da sociedade, tanto na formação dos cidadãos como na aplicação da justiça. Pena é que muitos façam por ignorar tal factor de estabilidade social. Os Convívios são uma boa terapia.

A razão da divulgação que vou fazendo, aos tempos da minha geração que combateu em África, é uma forma de protesto contra a ofensiva campanha que os governantes e "retornados" lançaram contra os Combatentes logo após a descolonização. Por diversas vezes repudiei as palavras atiradas contra os valentes homens da Nação, que sofreram os efeitos da guerra. As culpas pelo abandono das terras africanas caíram todas sobre aqueles que mais sofreram o desgaste físico e psíquico por causa da guerra. Depois vinham os insultos: "cobardes, que deixaram entregar tudo aos pretos", "traidores, que deixaram os colonos portugueses abandonados à sua sorte", e muito mais.
Os Combatentes é que foram abandonados à sua sorte, engolindo a raiva e os fantasmas, sofrendo com os traumas e as mazelas que os castigam pela vida fora.
É por isso que tenho colaborado activamente na organização de Exposições fotográficas e conferências, em centros culturais e escolas, com vista a mostrar aos portugueses que a guerra foi uma tragédia para os que morreram ou ficaram estropiados e um flagelo para todos os outros que percorreram as picadas e os trilhos das matas africanas. Além disso, participo na elaboração do “Projecto” de Estatuto dos Combatentes, com vista à sua negociação na Assembleia da República, através do qual serão reconhecidos os préstimos à Pátria; também não esquecemos que há mais de 1.700 mortos abandonados em terras africanas que não regressaram às terras das suas famílias, para o que contribuímos com uma recolha de 17.420 assinaturas numa Petição para o resgate de todos esses restos mortais para Portugal, a qual foi aprovada na Assembleia da República e entregue à Liga dos Combatentes em Junho de 2009. Através de negociações, intervenções na comunicação social ou de manifestações públicas, não vamos deixar que todos morram sem o devido reconhecimento.

MAC – Vila Nova de Gaia, Maio de 2015
Joaquim Coelho - Combatente em Angola e Moçambique